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Rua da Cabine
Se há memórias que me marcam, a Rua da Cabine, na Lapa do Lobo, é uma delas. Ali passei grande parte das minhas férias escolares, entre a casa e a mercearia dos meus avós maternos e o Vale do Boi, onde o meu avô amanhava a terra.
Hoje, tudo está diferente. Já não existem os habituais encontros com os amigos e primos, os almoços familiares de domingo, os pontapés na bola, as idas para o campo atrelado na bicicleta do meu avô, o cheiro a cigarros Kentucky da tasca, os relatos de futebol, as conversas dos mais velhos e as respetivas taças de vinho para lavar. A mercearia mais antiga da aldeia já não tem o brilho de outrora. A Rua que a serve não passa agora de um trajeto entre as casas e os quintais, um caminho cada vez menos palmilhado.
Impulsionado por uma motivação interior e através de uma narrativa íntima, senti a necessidade de interpretar esta dualidade de emoções fortes e assim criar uma série de imagens que, além de explorar visualmente um conceito de identidade pudesse também estabelecer uma ligação entre o Ontem e o Hoje. Haverá melhor termo para descrever esta relação do que a palavra Vida?
A escolha das fotografias que dão corpo a este volume, são também o resultado entre a presença e a ausência do meu avô.
Viver e perpetuar a sua memória é agora um privilégio.
Fernando Ramos era o meu avô. Perdi-o em janeiro de 2013, já no decorrer deste trabalho.